Por Lucas A. Guedes
Poucos comentaristas esportivos despertam tanto ódio e paixão como o jornalista Mauro Cezar Pereira. Trabalhando há mais de uma década na ESPN Brasil e assinando textos no UOL, Gazeta do Povo e Estado de S. Paulo, o jornalista se tornou célebre pelas opiniões contundentes, com boa argumentação e, na TV, com uma capacidade louvável de se comunicar e expressar de maneira clara sua opinião.
Mauro Cezar é um jornalista autêntico e, por isso mesmo, não faz e nunca fez questão de esconder para quais times torce. No Brasil, o Flamengo. Na Argentina, o Racing. E também já deixou claro de que na Europa sua torcida é para os times ingleses.
Definitivamente não há nada de errado em um jornalista esportivo não esconder seus times do coração. Há décadas atrás monstros do jornalismo se consagraram e conquistaram o respeito dos torcedores mesmo admitindo suas torcidas. Os casos mais emblemáticos talvez sejam os de João Saldanha (Botafogo) e Nelson Rodrigues (Fluminense).
Porém, algo importante para um jornalista de qualquer área é a capacidade de não deixar suas paixões pessoais interferirem em suas análises. Um jornalista da editoria de política, por exemplo, pode ter suas próprias ideologias, mas jamais deve deixá-las afetarem suas análises da conjuntura política, pois se não corre-se o risco de perda de credibilidade e acabar se comunicando apenas com quem pensa como ele. Mauro Cezar não tem conseguido essa frieza.
É bastante nítido para quem acompanha o trabalho de Mauro Cezar na ESPN que sua cobrança em cima do trabalho de Abel Braga é bastante superior a sua cobrança sobre outros técnicos. Esta cobrança excessiva é pelo motivo de Abel ser o atual treinador do Flamengo, pois ano passado e retrasado, quando o treinador trabalhava no Fluminense, Mauro pouco questionava o trabalho do técnico. Ou seja, a exigência sobre o treinador veio a partir do momento de sua contratação pelo Flamengo.
Não que o trabalho de Abel Braga não deva ser questionado, mas os erros cometidos pelo treinador atualmente não diferem muito dos erros cometidos pelo mesmo nas últimas temporadas, mas curiosamente o trabalho passou praticamente imune a críticas. Afinal, a torcida do Fluminense não merece que o trabalho no time seja tão questionado quanto o trabalho no Flamengo?
Nos jogos da semifinal da Liga dos Campeões, quando o Barcelona foi superado pelo Liverpool em vitória histórica em Anfield, o comentário pós-jogo de Mauro Cezar veio carregado de um estresse desproporcional a um jornalista sério. Mauro estava estressado porque ouvira antes do jogo em uma rádio que o Barcelona era maior que o Liverpool. Por que tamanha indignação? Mauro não escondeu em seu comentário: “sempre torço para os times ingleses”.
Aqui não se está propondo o cerceamento do trabalho do comentarista. A liberdade de expressão é preceito fundamental para qualquer veículo de comunicação que se diz sério. Mas o que quero mostrar é que a paixão descontrolada afeta diretamente os comentários e análises de alguém que não está na TV como representante dos times para o qual torce, e sim como jornalista esportivo que deve analisar o ocorrido e, claro, expor suas opiniões, mas sem deixar no torcedor a sensação de que o comentarista torceu contra o seu time do coração. Quem afinal gostaria disso, além da torcida do time exaltado?
Nas redes sociais, tanto no YouTube quanto no Instagram e twitter, Mauro Cezar é praticamente um setorista do Flamengo. Ele já recebeu essa crítica e respondeu da seguinte forma: “as redes sociais são minhas e posto o que quiser”. De fato as redes sociais são dele, mas de onde que veio essa grande massa de seguidores? O conheceram na padaria da esquina? Arquibancada do Maracanã? Não, a grande massa de seguidores de suas redes sociais o conheceram pelo exercício de sua profissão (jornalista, nunca é demais lembrar) nos veículos de comunicação para o qual trabalha. Ou seja, suas redes sociais, gostando ou não, são extensões de seu trabalho nestes veículos. Então tratar essas mídias como uma rede social pessoal não é muito correto, até porque o próprio Mauro as utiliza inclusive para divulgação dos programas nos quais vai aparecer.
Como disse no começo deste texto, Mauro Cezar é um jornalista com grande capacidade de articulação, argumentação e que se popularizou justamente por não falar o óbvio. O que proponho é apenas uma reflexão de quando as paixões pessoais interferem de maneira acidental (creio) em análises que não são só para flamenguistas, torcedores do Liverpool ou torcedores do Racing. Ele se comunica com torcedores de todos os times e, por isso mesmo, estes torcedores merecem o respeito do jornalista. Se ele não quer se comunicar para outros torcedores, que peça demissão do Estadão, Gazeta do Povo, UOL, ESPN, e vá entregar o currículo nos canais do YouTube que gravitam em torno do Flamengo. E não há demérito nenhum nestes canais, pois eles pelo menos não tentam fingir imparcialidade.